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Que Caramelo tenha um final realmente feliz — e nós também

Montagem de print da GloboNews sobre desenho de Nando Motta

Caramelo, como se tornou conhecido o cavalo que ficou sobre um telhado na cidade de Canoas durante as inundações que ainda atingem o Rio Grande do Sul, foi resgatado pelo Corpo de Bombeiros e pelo Exército nesta quinta-feira, 9 de maio, após estimadamente quatro dias ali. Agora ele está sob cuidados, mas sua situação é bastante delicada, segundo os veterinários.

Nós, do Instituto Nina Rosa, também torcemos pela total recuperação de Caramelo, porém nossa preocupação não é somente com sua saúde e bem-estar físicos. E depois que ele estiver totalmente restabelecido? Não sabemos como era sua vida antes de se refugiar no telhado fugindo da inundação. Como ele vivia e era tratado? Provavelmente gozava de boa saúde para resistir tanto tempo sem se alimentar e se hidratar, portanto devia estar bem nutrido, mas e quanto ao resto? Vivia em uma baia? Era explorado para trabalho, para esporte ou para entretenimento de humanos? Após retornar a seu antigo tutor ou ser encaminhado para um novo, como será sua vida?

E já se fala na mídia que ele é mais um animal-símbolo das mudanças climáticas, assim como foi o raquítico urso-polar sobre um pedaço de gelo no Ártico em registro da fotógrafa de natureza e ambientalista alemã Kerstin Langenberger, que repercutiu mundo afora em 2015.

Isso nos leva a mais uma reflexão, que diz respeito não apenas ao Caramelo ou aos cavalos — e ursos — em geral, mas a todos nós, terráqueos — animais não humanos e animais humanos. Somos nós, os animais “racionais”, os principais responsáveis por essas mudanças climáticas. Começando pelo hábito referente à mais básica de nossas necessidades, a alimentação, pois a pecuária é a principal causadora do desmatamento e a principal emissora de gases do efeito estufa, ultrapassando em muito os níveis de poluição da indústria de transportes. Já a produção de eletrônicos, roupas e plásticos, por exemplo, também é uma grande geradora de emissões, e os humanos consomem intensamente esses produtos, frequentemente de forma supérflua.

Os efeitos dessa inconsequência já vêm sendo sentidos há anos, em todo o planeta, cada vez mais fortes. Daí uma fotografia de um urso sensibiliza os “internautas” em 2015; o vídeo de um cavalo comove telespectadores, e os internautas também. Além do urso e do cavalo, no entanto, o bicho-homem também é afetado, e, dessa vez, severamente.

As pessoas se mobilizam para ajudar as vítimas humanas e não humanas, comemorarão a recuperação do cavalo Caramelo e o cessar das chuvas no sul do país. E depois? E enquanto isso? O consumismo desenfreado, inclusive da Amazônia por meio do consumo dos animais vindos dos pastos ali criados pós-desmatamento, continua e continuará, como se não tivesse nenhuma relação com essa tragédia? Como se nós não fôssemos os principais responsáveis e a maioria nem aí para fazer sua parte para evitar um futuro ainda mais catastrófico?

O ser humano sempre espera por “finais felizes”. Mas Caramelo terá um final feliz ou continuará sendo (ou passará a ser) explorado? E nós, teremos um final feliz se continuarmos a agir como se a responsabilidade não fosse nossa?

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